A menor das tragédias

As coisas mudam depressa no automobilismo. E não apenas na pista. Tome Bruno Senna por exemplo. Durante os testes realizados pela Honda no ano passado, ele certamente sequer pensava em disputar outro campeonato em 2009 senão o de Fórmula-1. Agora, após ver a montadora oriental abandonar o certame e ser preterido por Rubens Barrichello na Brawn GP, Bruno, salvo reviravolta marcante, está fora do campeonato da FIA. O caminho mais provável é o Campeonato Alemão de Carros de Turismo, o DTM, pela Mercedes.

Há quem considere uma série de passos para trás na carreira do brasileiro. Contudo, se confirmada, a parceria Senna-Mercedes tem lá bons dividendos. Além dos muros que cercam os autódromos de Fórmula-1 – que, óbvio, continua como meta da carreira de Bruno – dificilmente haveria coisa melhor. Quase impossivelmente. Na Indy Racing League, por exemplo, correria risco de perder o target da carreira. Em uma temporada regular de GP2, na qual foi vice-campeão em 2008, levaria chumbo se não fosse campeão. Detalhe é que fora das categorias de formação à F-1, como Fórmula-3 e a própria GP2, o DTM é um dos que possuem carros mais semelhantes com os presentes na categoria da – agora confusa – FIA. Não esteticamente, mas sim nas reações à pilotagem. De quebra, Senna poderia queimar etapas longe do certame e garantir oportunidade na McLaren, parceira da montadora de Stuttgart na F-1.

Não é segredo a ninguém. Para se brigar por vitórias e títulos na Fórmula-1 é necessário, no mínimo, estar em equipe de primeira linha. E tal condição nem sempre é concedida a um piloto que tiver bom rendimento numa esquadra pequena ou mediana – onde o principal parâmetro para analises restringe-se ao comparativo entre piloto e companheiro de equipe. É necessário ser forte nos bastidores, conquistar confiança de gente grande. Digamos, ter contatos. Prova disso está no histórico de seis dos oito pilotos titulares que integram McLaren, Ferrari, BMW Sauber e Renault, as quatro forças da F-1 atual.

Antes de debutarem na categoria, Robert Kubica e Nelsinho Piquet já eram pilotos de testes de suas atuais equipes, BMW e Renault, respectivamente. Lewis Hamilton não atuou em tal função, mas é, desde a infância, pupilo de Ron Dennis, um dos proprietários da McLaren. Heikki Kovalainen estreou em 2007 pela Renault que, apesar de bem aquém do time bicampeão do Mundial de Pilotos, com Fernando Alonso, proporcionou ao finlandês a chance de mostrar serviço suficiente para saltar à McLaren. Já Felipe Massa e Alonso são exemplos típicos do quanto um contrato com gente grande no paddock ajuda na busca por um carro de equipe de primeira linha.

Alonso estreou na Fórmula-1 pela Minardi, durante a temporada 2001. Como não poderia ser diferente a qualquer sujeito que passasse pelo modesto time de Faenza, Nanín pouco pode fazer. Mas no ano anterior, quando era uma das sensações da Fórmula-3000, o espanhol conquistou a confiança de Flavio Briattore e um contrato com o cartola italiano. Não por acaso passou à Renault, como piloto de testes, em 2002. No ano seguinte, estreou como titular. Já Massa começou a mostrar serviço na F-1 com boas performances ao longo de três campeonatos na Sauber. Contudo, o maior passo da carreira aconteceu antes da estréia no certame, em 2001. Enquanto barbariza os concorrentes e faturava com sobras o título da Fórmula-3000 italiana, Felipe foi contratado como piloto da Ferrari. Daí foi emprestado à Sauber; só para ganhar experiência.

Seria estupidez afirmar que essa dupla só alcançou vagas nos principais times porque tinham bons contatos. São pilotos de talento inquestionável, que, alheio aos resultados que poderiam conseguir com bólidos nem tão competitivos, teriam chance em escuderia graúda em algum instante. A única questão é que os contatos estabelecidos antes da F-1 aceleraram o debut em time grande. Aliás, veja Rubens Barrichello. Ele chegou à Ferrari após sete longas temporadas de boas performances pelas intermediárias Jordan e Stewart. Sim, é verdade que algumas coisas aconteceram nos bastidores que impediram Rubinho de ingressar em time de primeira linha – algo que prometo abordar em futura coluna – antes de 2000. Mas tudo me leva a crer que a agonia de Barrichello em bólidos razoáveis duraria menos tempo se, antes de ingressar na F-1, já tivesse ganho a fé de gente de Renault, Mercedes ou Ferrari. Até porque seus resultados em pista sempre foram positivos.

Claro que nem tudo são flores, bombons e juras de amor na eventual parceria Bruno-Mercedes. A concorrência no DTM é dura, pois o nível técnico dos pilotos é elevado, marcado pela experiência – historicamente, até com a presença pilotos que já disputaram a F-1 com sucesso. Além disso, nada obriga a Mercedes a lutar para Senna ter uma vaguinha na McLaren, até mesmo de segundo piloto de testes. Tampouco, quando poderia surgir tal oportunidade: 2010, 2011… 2057. Mas pelo fato de ser jovem e ter exibido louvável evolução como piloto ao longo de quatro anos em categorias de acesso à F-1, Bruno, com dedicação e resultados consideráveis na categoria tedesca, pode conquistar os dois lados da equipe de Woking. Desse modo, seria credenciado como forte aspirante a oportunidades vindouras na McLaren. Até mesmo, em futuro breve, ser emprestado a Brawn F1 ou Force India, equipes cujos carros são equipados com motores Mercedes.

Bruno Senna esta preste a contornar a curva mais importante de sua ainda curta carreira como piloto profissional. Se não corresponder, pode colocar uma grande e pesada pá de terra nas chances de correr pela Fórmula-1; se der certo, pode entrar pela porta principal do certame da FIA. Em meio a riscos e incertezas, creio que trata-se de uma opção arrojada e extremamente válida. Se der certo, Bruno estoura a boca do balão.

Papo Ligeiro

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Pontos da discórdia- Pouco antes do fechamento desse artigo, recebi a notícia de que a FIA estaria disposta a pensar novamente no regulamento de pontos recentemente adotado. Graças a Deus…

Ronaldo e Rubinho- Está bacana ver o ressurgimento de Ronaldo ao futebol. Espero que o mesmo aconteça com Rubinho na Fórmula-1. Eles merecem.

Rubinho, o mesmo- Aliás, se Rubinho continua o mesmo piloto competente, é incontestável que mostra-se o mesmo “gera-expectativas” de outras épocas. Está soltando elogios às dúzias para o BGP 001, da Brawn GP. Se fosse ele, até para evitar cobranças semelhantes a dos tempos de Jordan, Stewart e Ferrari, manteria minha boca fechadinha…

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