O tricampeão mundial de Fórmula 1 Nelson Piquet chegou aos 60 anos bem-vividos, no último dia 17 de agosto de 2012. Piquet teve uma carreira que não se restringiu à categoria máxima do automobilismo, na qual conquistou 23 vitórias e 24 poles – e de onde saiu depois de três campeonatos -, mas também a provas importantes como as 500 Milhas de Indianápolis, a Mil Milhas Brasileiras e corridas internacionais de endurance, onde se aventurou após largar o circo da F-1.
Protagonista de uma das maiores rivalidades das pistas em toda a história, que causou uma verdadeira divisão da torcida brasileira, já que sempre foi um desafeto de Ayrton Senna, Nelson Piquet segue ligado na carreira dos quatro filhos – de sete que teve no total – que seguiram seus passos no mundo da velocidade.
Piquet tornou-se um brasiliense de corpo e alma quando, no início da década de 1960, aportou na recém-nascida capital da república, levado pelo pai Estácio Souto Maior e pela mãe, Dona Clotilde Piquet Souto Maior. Caçula de uma família de quatro irmãos, Nelson desfrutou de maior liberdade – sem deixar de enfrentar a oposição do pai quando, ao abandonar os estudos após ganhar uma bolsa em Atlanta (EUA), onde se revelou um bom tenista, optou pelo automobilismo.
Nelson – como quase 100% dos automobilistas brasileiros – começou no kart, e foi muito amigo de outros pilotos famosos, como Alex Dias Ribeiro e Roberto Pupo Moreno. Piquet ganhou várias corridas naquela época e também passou a competir com um Fusca azul-escuro, com o número 13.
A estreia nos monopostos aconteceu no ano de 1974, na Fórmula Super Vê Brasil. Àquela época, ele assinava Piket no sobrenome, pois ainda enfrentava a resistência da família – especialmente a oposição de seu pai – devido ao seu envolvimento com o esporte a motor. Venceu corridas logo na primeira temporada, mas se sagrou campeão somente dois anos depois. Então ele fez as malas e partiu rumo à Europa.
Na Fórmula 3, competiu por dois anos, primeiro a F-3 Européia em 1977 e foi terceiro, com duas vitórias. No ano seguinte passou para a F-3 Inglesa, onde derrotou o compatriota Chico Serra, que a imprensa considerou o primeiro grande desafeto de Piquet no automobilismo, além do britânico Derek Warwick. Seu desempenho chamou a atenção do tricampeão mundial Jack Brabham, que Piquet considera como um dos seus maiores ídolos no automobilismo, e de seus muitos chefes de equipe de Fórmula 1.
Ainda naquele ano de 1978, estreou com um Ensign no GP da Alemanha, após um teste bem-sucedido com a McLaren M23 da pequena BS Fabrications, em Silverstone. E em sua quinta corrida apenas, já estava ao volante da Brabham, graças a um contrato assinado com Bernie Ecclestone, que então era o chefe daquela equipe.
Lá, Piquet mostrou que era rápido, a ponto de deixar Niki Lauda para trás e o austríaco anunciar sua aposentadoria antes do fim do ano de 1979. Como primeiro piloto, o brasileiro formou uma parceria cheia de sucesso com o engenheiro sul-africano Gordon Murray, ajudado também pelos homens de confiança de Ecclestone: Charlie Whiting, hoje diretor de provas da FIA e na época chefe da equipe Brabham, e Herbie Blash, braço-direito de Bernie e então chefe dos mecânicos.
À exceção de Murray, todos se reencontraram em Interlagos, em 2011, quando Piquet deu uma volta comemorativa a bordo da Brabham BT49 do primeiro título mundial de 1981, relembrando os 30 anos da conquista.
Emoção à parte, Piquet revelou seu lado moleque e brincalhão. Sabendo que a volta era transmitida pela televisão, sacou do macacão uma bandeira do Vasco da Gama, seu clube de coração, e desfilou com ela ante o olhar incrédulo dos torcedores de Corinthians, Palmeiras, Santos e São Paulo em Interlagos.
Pela Brabham, equipe que defendeu durante sete temporadas, Piquet foi duas vezes campeão, em conquistas históricas derrotando o argentino Carlos Reutemann em 1981 e a esquadra francesa formada por Alain Prost, René Arnoux e Patrick Tambay, em 1983.
Em meio às suas vitórias daquela época, ele foi protagonista de um momento jamais esquecido por seus fãs: a cômica cena de pugilato com o chileno Eliseo Salazar, no GP da Alemanha de 1982, quando foi tirado da pista pelo então retardatário. Lembrando: os dois estavam e ficaram de capacetes, o tempo todo.
Insatisfeito com a fragilidade do motor BMW, que o impossibilitou de disputar o título outras vezes na equipe, transferiu-se para a Williams no ano de 1986. Só que Frank Williams sofreu um acidente de carro, ficou paraplégico e o comando da equipe caiu nas mãos de Patrick Head, que privilegiava seu companheiro , o inglês Nigel Mansell.
O sem-número de picuinhas e as frases de efeito de Piquet repercutiam, para a delícia da imprensa. Contra todos, Piquet foi 3º colocado no primeiro ano na Williams, perdendo o título por três pontos, mas sagrou-se tricampeão em 1987, com uma sequência de pódios que desnorteou Nigel Mansell a ponto do “Leão” bater no treino livre do GP do Japão e jogar a toalha, entregando a taça ao companheiro e rival.
Piquet, aliás, usou deste expediente de chegar ao máximo de corridas possível em segundo, atrás do “idiota veloz” (palavras do próprio Nelson, referindo-se à Mansell), após o grave acidente sofrido em 1º de maio, na famigerada curva Tamburello.
Apesar dos dissabores, Piquet teve grandes momentos na Williams. A vitória no GP do Brasil de 1986 certamente está entre eles, numa inesquecível dobradinha com Ayrton Senna. Mas o principal, sem dúvida, é a histórica manobra de ultrapassagem, novamente sobre Ayrton Senna durante o GP da Hungria, naquele mesmo ano. Algo que o tricampeão Jackie Stewart, comentando para a TV, descreveu como “dar um looping a bordo de um Boeing 747”. A manobra é considerada a melhor da Fórmula 1 em todos os tempos.
Em 1988, Nelson trocou a Williams pela Lotus para fugir do ambiente nocivo que envolvia a relação entre ele, Head e Mansell, mas os resultados não vieram. A Lotus, já uma equipe em decadência, errou a mão no projeto do carro. E quando os motores Honda foram trocados pelos fracos Judd, a carreira de Piquet chegou a ser posta em dúvida. Some-se a isto o polêmico episódio dos testes de pneus pouco antes da temporada de 1988, quando comprou uma briga com Ayrton Senna, que dividiu “piquetistas” e “sennistas” e tornou os dois inimigos declarados. Mesmo após tudo isto, ele assinou um contrato de risco com a Benetton, contemplando US$ 100 mil por ponto marcado, para a temporada de 1990.
Aos 38 anos, Piquet ressurgiu das cinzas. Venceu as duas últimas corridas daquele ano – a da Austrália foi a 500ª da história da Fórmula 1 – e chegou em 3º lugar no campeonato. Com 44 pontos somados, afora os bônus, ele conseguiu lucrar nada menos que US$ 8 milhões. Em 1991 ele disputaria sua última temporada na categoria. Começou o ano tendo o velho camarada de Brasília Roberto Pupo Moreno como companheiro de equipe e acabou ao lado de um atrevido estreante alemão chamado Michael Schumacher. De bom mesmo, só a 23ª e última vitória no GP do Canadá (cortesia do velho rival Mansell) e a comemoração do 200º GP da carreira em Monza. Após o GP da Austrália, Piquet deixou a Fórmula 1 com 207 corridas disputadas, 23 vitórias, 60 pódios, 24 poles, além de 23 voltas mais rápidas.
Sem perspectivas na Fórmula 1, em 1992 Nelson aceitou um novo desafio: disputar as 500 Milhas de Indianápolis. Assinou com John Menard e fez os primeiros treinos a bordo de um Lola com motor Buick derivado de um bloco em produção de série. O carro era dos mais rápidos na pista e ele vinha fazendo voltas próximas de 370 km/h de média, quando, no dia 8 de maio, se espatifou no muro da curva 4, sofrendo um horrendo acidente que lhe causou fraturas nos dois pés e nas duas pernas.
Piquet foi salvo da morte pelas mãos do dr Terry Trammell, o ortopedista mais conceituado do Hospital Metodista de Indianápolis. Mesmo com tudo isso, ainda voltou a Indianápolis para fazer o que não conseguira no ano anterior. Largou em 13º na corrida de 1993, mas logo abandonou.
Depois disto, suas participações como piloto tornaram-se esporádicas. Fez corridas de enduro, ganhando duas edições da Mil Milhas Brasileiras, uma delas com seu filho Nelson Piquet Jr, em 2006. Esta foi, aliás, a última vitória de sua carreira.
Fora das pistas, tornou-se um próspero empresário do ramo de rastreamento de veículos via satélite. Os números não mentem: Piquet, pai de sete filhos de vários casamentos, deixará para seus herdeiros uma fortuna muito maior em relação a que conquistou em 13 anos de Fórmula 1.
» Estatísticas do piloto na Fórmula 1 |
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Campeonatos: | 3 |
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Vitórias: | 23 | |||||||||||||
Pódios: | 60 | |||||||||||||
Poles: | 24 | |||||||||||||
Voltas mais rápidas: | 23 | |||||||||||||
Melhor posição num GP: | 1º | |||||||||||||
Total de GPs: | 207 | |||||||||||||
Total de pontos: | 485,5 | |||||||||||||
Temporadas: | 1978 – 1991 |