Um pequeno gigante brasileiro

A notícia mais agradável do automobilismo nos primeiros dias desse ano ainda recém-nascido foi, sem dúvida, a de que Cristiano da Matta disputará o campeonato 2010 da Fórmula Truck, pela Iveco. Afinal, será a reestreia do mineirinho em uma temporada regular de esporte a motor após um pavoroso acidente que quase tragou sua vida, durante testes coletivos da Champ Car, no circuito de Elkhart Lake, em 2006. Reestreia em um campeonato por uma figura marcante da história recente do automobilismo brasileiro.

À primeira vista, Cristiano da Matta pode parecer um sujeito vulnerável. Um bocado tímido, 1,65m de altura, é dono de uma voz baixa, dominada pelo simpático sotaque tipicamente mineiro. Mas a aparente fragilidade para por aí. A começar pelo preparo físico que, ao menos nos tempos de Champ Car, impressionava. Aliás, em 2001, até venceu uma prova de triatlo. Além disso, quando o baixinho decide frasear algo, espere por sinceridade. Muita sinceridade. Inclusive quando está de luvas, macacão e sapatilhas, algo raro em um esporte que, como no futebol, é dominado por profissionais com discursos pré-fabricados e ridiculamente comportados.

Uma das ocasiões em que o baixinho soltou os cachorros – de modo sutil, aliás – aconteceu pouco após o GP Brasil de 2003. Os Toyotas se mostraram carros problemáticos desde os primeiros treinos em Interlagos. Péssimos em aderência, ora saíam de frente; outrora, de traseira. Não à toa, o brasileiro cravou apenas o 18º tempo no treino oficial. O companheiro de time, Olivier Panis, o 15º. Na corrida, o enredo se repetiu. Da Matta foi o último entre os dez pilotos que receberam a quadriculada. Situação em que muitos pilotos soltariam blábláblás como “Hoje o carro esteve ruim, mas estamos trabalhando muito para desenvolvê-lo. Fica para a próxima”. Não Cristiano. “Foi ridículo”, disparou. “Nunca senti tanta vergonha na minha vida”.

Mas se a personalidade marcante sempre foi um atrativo, vale afirmar também que Kiki se mostrou piloto acima da média por todas as categorias que passou. Inclusive Fórmula-1. É bem verdade que seus números no certame parecem não encantar: 13 pontos em 28 GPs disputados entre 2003 e 2004. No entanto, não podemos esquecer que a Toyota, ao menos durante a estadia do brasileiro, jamais excedeu ao posto de time intermediário. Aliás, certamente não foi apenas naquela prova em Interlagos que a competitividade dos TF100-e-tanto deixou o mineirinho ruborizado.

De fato, algumas façanhas mostram que o trabalho de Cristiano na Fórmula-1 não foi decepcionante. Muito pelo contrário. Sobretudo em pleno ano do debut no certame da FIA, em 2003, quando somou mais pontos que o companheiro de equipe, Olivier Panis. Cá entre nós, embora o francês não fosse um Michael Schumacher, dera uma trabalheira danada ao Jacques Villeneuve, campeão de F-1 em 1997, na BAR. E já era um piloto bastante experiente, com nada menos que nove temporadas na categoria.

Ainda em 2003, Da Matta tirou da cartola um terceiro melhor tempo no treino oficial do Grande Prêmio do Japão e liderou as primeiras da Toyota no certame. Foram 16 no comando em Silverstone, na Inglaterra.

É bem verdade que ele só herdou a liderança porque permaneceu na pista durante a bandeira amarela originada pela invasão do mesmo irlandês maluco que barrou Vanderlei Cordeiro de Lima, na maratona das Olimpíadas de Atenas, em 2004; ao passo que os líderes anteciparam a primeira série de pit stops. Mas Cristiano mostrou uma tocada bastante firme enquanto ponteou a corrida, sem deslizes. Não se intimidou com os ataques de Kimi Raikkonen, então líder do campeonato e com um potentíssimo McLaren. Isso tudo em um dos circuitos mais velozes da F-1. Da Matta parecia até um veterano, a bordo de uma Ferrari ou uma Williams.

Sinceramente, pouco importa qual será o rendimento de Cristiano nas pistas da Fórmula Truck nesse ano. Sua volta ao cotidiano do automobilismo já é o suficiente a todos que admiram esse pequeno gigante brasileiro.

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