Rapsódia de Sepang

Pouco importa se é campeão do mundo ou alguém relegado às últimas filas do grid. Qualquer piloto é capaz de identificar prós e contras de situações que encontra em pista. Não à toa o sinal de alerta sobre as desvantagens de uma prova de Fórmula-1 iniciada às 17 horas fora acionado por alguns dos volantes da categoria na semana que antecedeu o GP da Malásia. A tempestade, tão comum nos fins de tarde no país asiático durante essa época do ano, deu às caras em Sepang. Somada à proximidade do pôr-do-sol e a consequente queda na visibilidade, não restou alternativa além de encerrar a segunda etapa de 2009 após 32 das 56 voltas pré-estabelecidas.

Diante de tal cenário, surge uma questão. Será que a turma de FIA e FOM escuta a opinião dos protagonistas de seu espetáculo, os pilotos, durante a elaboração do calendário de uma temporada? Não tenho dúvidas que sim. Entretanto, há um abismo entre escutar e dar razão. Onde situam-se interesses comerciais.

Vamos aos fatos. Até 2008, a etapa malaia era iniciada às 15 horas locais. Nesse ano, a largada foi postergada em duas horas. Outras duas provas sofreram mudanças na programação: a da Austrália, palco da abertura do campeonato, saiu das 15h30 às 17 horas; a do Japão, 16ª do ano, das 13h30 às 15 horas. No caso do GP malaio, tal alteração ocorreu para fugir do forte calor. Mas também para tirar tais GPs do início das manhãs européias, beneficiando assim a transmissão do evento por emissoras do continente.

Trata-se de uma intervenção compreensível. A Fórmula-1 nasceu na Europa e sua base continua por lá. Apesar da invasão de etapas na Ásia, o Velho Continente ainda abriga nove das 17 provas do ano. Oito das dez equipes do grid são genuinamente européias; já as asiáticas Force India e Toyota possuem sedes na Europa. Mas se o continente é inquestionavelmente importante ao certame, claro, não podemos esquecer que trata-se de um evento de alcance mundial. É injusto agradar a audiência européia em detrimento a de outros cantos do mundo. Especialmente quando prejudica qualquer GP do calendário. Algo ocorrido na Malásia.

Encontrar solução para agradar a gregos e troianos – ou melhor, a ocidentais e orientais – é algo necessário. Porém, extremamente complicado. Em princípio, realizar GPs como os da Austrália e da Malásia em horários mais tradicionais a eventos do certame, como a partir de duas ou três horas da tarde, seria a alternativa mais simples. Mas, sabe-se lá qual seria a reação de telespectadores e patrocinadores europeus diante de uma nova modificação no itinerário dessas corridas, especialmente quando, dessa vez, pareça-lhes nada favorável.

Outra opção é transformar as etapas australiana e malaia em eventos noturnos – óbvio, sob iluminação artificial. Além de realizados sob temperatura mais amena, ganhariam em charme, especialmente Sepang, um dos circuitos de arquitetura mais bonita do mundo. E até o bendito fuso-horário parece que seria generoso mundão afora. Uma prova às 20 horas da Malásia seria transmitida às 13 horas de Portugal e Reino Unido; 14 horas de Espanha, França, Alemanha e Itália; 17h30 horas da Índia; 20 horas da China (horário de Beijing); 21 horas do Japão. Inclusive nosso Brasilzão sairia no lucro. Baseado no horário de Brasília, a prova na Malásia passaria às nove da manhã, ou seja, horário que o fã verde-amarelo está acostumado a acompanhar os GPs europeus da Fórmula-1.

Evidente que a coisa não é tão simples. O problema é o alto valor do implemento de um sistema de iluminação artificial no circuito. Em Cingapura, palco da primeira etapa noturna da F-1, no ano passado, foram investidos mais de 30 milhões de Euros nos 1500 refletores ao longo do belo circuito de rua. Aliás, vale lembrar que a possibilidade de GP noturno na Malásia já foi levantada ao início desse ano, contudo os organizadores do evento rechaçaram a idéia. Vai saber se é porque preferem vê-lo à tarde ou tiveram auxílio financeiro e incentivo comercial para adequar o circuito a uma corrida desse tipo negado pela Formula One Management (FOM). Aliás, segundo os organizadores malaios, o contrato firmado entre a Fórmula-1 e eles, válido até 2015, não possui qualquer menção à realização de corridas à noite.

Independente de qual seja a posição de Ecclestone e Mosley sobre o assunto – isso se eles considerarem o bafáfá de Sepang como um problema, creio que a Fórmula-1 deva valorizar e preservar seus espetáculos, os Grandes Prêmios. Inclusive reservando tempo e condições técnicas para que a quadriculada apareça após o cumprimento de todas as voltas pré-estabelecidas. Afinal, ver uma prova durar tão pouco, especialmente diante de tantas disputas e ultrapassagens, é pior que matar umas horinhas de sono. Muito pior.

PAPO LIGEIRO

Essa vale post-scriptum- Apesar das críticas, considerei inteligente o encerramento da corrida na volta 32. Havia pouco mais de 20 minutos entre o anúncio do fim da corrida e o pôr-do-sol. Levando-se em conta o relato de Jenson Button de que os carros eram 20 segundos mais lento que o safety car pouco antes da bandeira vermelha, quantas voltas seriam possíveis? Sete, oito? Risco desnecessário. Errado mesmo, só o início da corrida às 17 horas.

Metade em 1991- Fazia quase 18 anos que apenas metade dos pontos eram contabilizados num GP de Fórmula-1. Em 3 de novembro de 1991, uma tempestade assolou o circuito de Adelaide, palco da etapa de encerramento daquela temporada. A corrida, que marcou a despedida de Nelson Piquet da Fórmula-1, foi finalizada após apenas 14 das 81 voltas pré-estabelecidas e durou pouco mais de 24 minutos. A vitória ficou com Ayrton, que levou cinco ao invés de dez pontos pelo triunfo. O tricampeão foi seguido por Nigel Mansell (três pontos), Gerhard Berger (dois pontos), Piquet (1,5 ponto), Riccardo Patrese (um ponto) e Gianni Morbidelli (0,5 ponto).

Na Le Mans, bom começo- Pois é, não é que Bruno Senna desbancou esse humilde colunista? Ao invés de partir à DTM, pela Mercedes, ele fechou com a equipe Matmut Oreca (Oreca-Judd), de Le Mans Series. E fez bonito na estréia, nos 1000 km da Catalunha. Em companhia do monegasco Stéphane Ortelli, Bruno foi terceiro colocado na LMP1. A vitória ficou com o trio da Aston Martin Racing (Lola-Aston Martin) formado por Stefan Mucke, Tomas Enge e Jan Charouz. De qualquer modo, há quem me garanta que a Mercedes continua de olho no rendimento em pista de Senna.

Custou caro- Pois é, o bafáfá sobre Lewis Hamilton e a bandeira amarela na Austrália está saindo caro à turma de Woking. Muito caro. Além do inglês ser desclassificado da etapa em Melbourne, a McLaren vai ter de esclarecer o ocorrido durante a próxima reunião do Conselho Mundial da FIA, no dia 29. Em 2007, a equipe foi acusada de espionagem à Ferrari. Pagou multa de US$ 100 milhões e foi banida do Mundial de Construtores. Cheiro de nova multa gorda no ar…

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