Um ano, dois campeonatos

A vitória do ferrarista Kimi Räikkönen sacramentou a impressão de que acompanhamos a dois campeonatos de Fórmula-1 em 2009. O finlandês – ainda sem cockpit garantido à próxima temporada, ao que indica – foi o quinto piloto a triunfar nos últimos cinco Grandes Prêmios; a Ferrari, a quarta equipe. Cenário bastante distinto ao das sete primeiras provas do ano, quando Jenson Button, da Brawn, beliscou seis vitórias e nada menos que 94% da pontuação máxima a um piloto no período. Época em que barbarizou a concorrência de tal modo a parecer que o caneco de 2009 viria com facilidade vista apenas em raras ocasiões na categoria.

Pode ficar a impressão de que o rendimento da equipe do outrora pupilo de Frank Williams caiu ao longo de 2009. Mas ouso afirmar que o carro da Brawn ainda é o foguete do período dominante de Button. Acontece que o time não conseguiu dar jeito ao “probleminha” que acompanha seus bólidos desde o início da temporada: o já famigerado atraso para atingir e manter o aquecimento ideal dos pneus em provas sob temperaturas menos elevadas. Trata-se de um dos poucos pontos negativos do BGP001. Senão o único. E que só não ficou tão evidente ao começo do campeonato porque as temperaturas nos GPs à época foram superiores às registradas nas últimas provas.

Nada menos que cinco das sete primeiras etapas de 2009 assinalaram temperaturas de pista entre 38 e 50ºC: Malásia, Bahrein, Espanha, Mônaco e Turquia. Button faturou o primeiro lugar em todas. No 11º GP, em Valência, Rubinho venceu sob 49ºC. A única prova “quente” que um carro da Brawn não faturou foi a décima do ano, na Hungria. Em Hungaroring, os termômetros registraram 43º C.

Mas se a questão dos pneus é um mistério a ser desvendado pela equipe de Brackley, as rivais da Brawn evoluíram a partir da oitava prova, na Inglaterra. E muito. Tanto que não é exagero afirmar que os carros de Red Bull, Ferrari e McLaren encontram-se em nível de competitividade semelhante ao da Brawn. Em algumas ocasiões, o trio apresenta rendimento até sensivelmente superior.

A primeira equipe a evoluir consideravelmente foi a Red Bull. Em Silverstone, o time estreou pacote aerodinâmico marcado, sobretudo, por alterações na frente do bólido. O bico do carro era mais largo em relação ao de corridas anteriores. A criação do astuto Adrian Newey ajudou Sebastian Vettel e Mark Webber a cravarem dobradinhas nos GPs da Inglaterra e da Alemanha, além de terceiros lugares na Hungria e na Bélgica.

Ainda na prova inglesa, a Ferrari reduziu a distância entre-eixos do F60. A frente do monoposto ganhou em equilíbrio e agilidade no contorno de curvas sob “baixa” velocidade. Pela segunda vez no ano, os dois carros vermelhos marcaram presença na zona de pontuação. Felipe Massa terminou a prova em quarto lugar. Räikkönen foi o oitavo. Contudo o grande salto viria na corrida seguinte, em Nürburgring, quando a alteração recebeu a companhia de um difusor com três “grades” em substituição ao de apenas uma. Nessa prova, pódio para Massa: terceiro lugar.

Detalhe é que com esses acréscimos ao equilíbrio, o modelo F60 passou a extrair mais potência do motor Ferrari. E até mesmo o funcionamento do KERS tornou-se mais adequado. Afinal, se o sistema era acionado para recuperar a velocidade “não-desenvolvida” por conta de um chassi instável, agora representa um ganho real em relação às rivais desprovidas do dispositivo. Algo que ficou evidente nos embates de Räikkönen contra a Force India, de Fisichella, no GP da Bélgica.

Situação semelhante a da Ferrari ocorre na McLaren. O time de Woking também tem KERS e um motor que puxa muito bem. Mas só passou a usufruir esses atributos após apresentar mudanças radicais no bólido, em Nürburgring. Mudou-se asa dianteira, assoalho, difusor e até a tampa que cobre o motor. Esse mexe-mexe surtiu efeito já nos primeiros treinos no circuito alemão. Estima-se que as alterações tenham deixado o carro 0s8 mais veloz. Crescimento que tornou-se inegável com a vitória em Hungaroring e o segundo lugar em Valência, dois dos circuitos mais travados da Fórmula-1 atual. Ambos os resultados obtidos por Lewis Hamilton.

Diante do atual regulamento da categoria, que impede a realização de testes ao longo da temporada, a ascensão de McLaren, Ferrari e Red Bull merece louvor. Embora as equipes tenham diversos aparatos para testar detalhes da aerodinâmica dos bólidos, como o túnel de vento, é mesmo na pista que se observa o resultado de cada modificação no carro. Ou seja, engenheiros e mecânicos vão saber os efeitos dessas alterações apenas nos treinos da sexta-feira que antecede a um Grande Prêmio.

Logo, surge um interessante fenômeno. Se o resultado de uma nova peça ficar abaixo das expectativas, as equipes, basicamente, têm dois caminhos. Primeiro: buscar o desenvolvimento do aparato durante o fim de semana e, em muitas ocasiões, alijar as possibilidades de bom resultado em uma corrida. Segundo – e menos provável: voltar à configuração antiga e queimar algumas centenas de milhares de dólares – ou milhões, até mesmo – empregados no desenvolvimento da dita “inovação”.

Que Button me desculpe, mas esse segundo campeonato de 2009 está bem mais empolgante que o primeiro.

1.669.209FJPB1.5

Link permanente para este artigo: https://www.esportesmotor.com/um-ano-dois-campeonatos/

Deixe um comentário

Seu e-mail não será publicado.

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.